Jogos Vorazes,
real or not real?
Já faz um bom tempo em que as pessoas começaram a falar na série de livros entitulada “Jogos Vorazes”. A ideia básica do livro é a seguinte: os seres humanos entraram em guerra uns com os outros e praticamente todo o planeta ficou desabitado, sobrando um único país, Panem, que vive sob um regime muito parecido com uma ditadura. O país está dividido em 12 distritos mais a Capital, sendo esta uma espécie de “metrópole” que trata os distritos como suas colônias, explorando-os. Assim, os distritos são miseráveis em comparação com a Capital. Ela também criou os chamados Jogos Vorazes, em que um rapaz e uma moça de cada distrito devem ser lançados em uma arena onde lutarão até a morte, havendo apenas um vencedor. Com isso, a Capital deixa bem claro quem está no controle.
Isso foi só um pequeno resumo para que alguém que nunca tenha ouvido falar da história possa se situar. Vendo por esse lado, parece um cenário bem interessante para a construção de um livro. Um grande centro de poder que se sustenta em custa do sofrimento de vários outros aglomerados de gente. Parece muito irreal, com um toque de fim dos tempos e da humanidade em si. Mas tem algo que vem martelando na minha cabeça desde que li a série.
E se os jogos fossem verdade?
E se eu dissesse que eles existem, sim, e que estão acontecendo neste exato momento, enquanto você lê este texto? E se de repente nada disso fosse apenas ficção?
As pessoas da Capital são fúteis. Elas têm diversões mesquinhas. Gastam milhares e milhares nos Jogos Vorazes, assistindo jovens de todo o país matarem uns aos outros apenas para preencher seus dias monótonos. Compram roupas caríssimas de marcas finas. Passam metade de seus dias preocupadas com suas aparências. Enquanto isso, a população dos distritos morre de fome e frio.
Qualquer um que lesse o livro odiaria todos que moram na Capital. O que nós mal percebemos é que, se os Jogos Vorazes fossem reais, nós seríamos habitantes da Capital. Nós gastamos nosso dinheiro em diversões ridículas enquanto assistimos crianças esfomeadas vagarem pelas ruas. Nós preferimos gastar mais em uma marca ou outra apenas por status.
Não é como se a gente pudesse fazer alguma coisa, você diria. É assim que as coisas são. Os jogos existem, as regras são essas. Aceite-as. A gente não está fazendo nada de errado. A culpa não é nossa que nós nascemos aqui, e eles nasceram lá.
Quem são eles? Quem são aqueles que moram nos distritos?
A analogia pode ser analisada de várias esferas diferentes. Eu diria que em um nível municipal, as pessoas dos distritos são aquelas das camadas mais pobres, que são remuneradas com os piores salários e fazem os trabalhos mais execrantes. Em um nível mais amplo, os distritos seriam os estados menos favorecidos desse nosso Brasil. Em uma escala global, temos os países “menos desenvolvidos”, que são explorados pelas grandes potências direta e indiretamente. Guerras que acontecem apenas para reforçar quem são aqueles que mandam no mundo.
Não podemos estipular vítimas. Esse tipo de sistema é daqueles em que todos são vítimas. E, infelizmente, um dos únicos em que a humanidade parece saber viver. Nossa sociedade está sempre baseada na hierarquia e na exploração.
E os agressores? Quem são os mandantes da Capital? Quem comanda os jogos?
Lá dentro, nós temos a resposta. Sabemos quem está fazendo isso conosco, não sabemos? Porque eles não atingem só os pobres – nós, da Capital, também sentimos agora o peso da injustiça, porque abrimos os olhos para o que acontece no mundo. Abrimos?
E se no fim não houvessem bandidos? E se o grande vilão morasse aí… dentro de você?
É inevitável. Está dentro de todos nós, mesmo que diferente em cada um. Todos nós temos ganância. Todos nós somos fracos. É muito difícil encontrar alguém que não sucumbiria facilmente ao poder. Podemos realmente culpar aqueles que estão no comando do mundo? Será que não faríamos a mesma coisa se tívessemos o poder que eles tem?
Mas a pergunta mais importante de todas é: quem são os rebeldes? O que vai acontecer se eles entrarem em ação?
A verdade, meu caro, é que os Jogos Vorazes são mais verídicos do que se pode imaginar. Não tenho certeza se Suzanne Collins percebeu o que estava fazendo, mas tenho a impressão de que sim. Ela sabe que é na realidade dos jogos que nós vivemos. E que nós infelizmente não sairemos desta com vida.